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Administrações tributárias de Angola e Portugal prontas a trocar informações

Com dois acordos de cooperação na manga há mais de um ano, as administrações tributárias de Angola e Portugal têm estado a preparar o terreno para iniciar a troca de dados fiscais, um instrumento de cooperação que permitirá aos inspectores tributários de cada país pedir reciprocamente informações sobre uma pessoa, uma empresa ou um negócio concreto que estejam a inspeccionar.

Embora a convenção que regula esta troca de informações seja de Setembro de 2018 e já esteja em vigor desde o último Verão, o novo instrumento só passou a ter efeitos práticos há poucos dias, desde 1 de Janeiro.

Semelhante a muitos outros acordos que Portugal tem com dezenas de jurisdições, o texto era há muito aguardado pelas duas autoridades tributárias e, segundo o jornal PÚBLICO, há vontade de parte a parte em iniciar essa troca de dados entre Luanda e Lisboa. E é um passo relevante num momento em que se sabe que a empresária Isabel dos Santos ( com interesses em empresas portuguesas como a Galp, o banco Eurobic, a operadora Nos e a tecnológica EFACEC), é alvo de um processo de arresto de contas bancárias e participações em empresas em Angola, onde se inclui o banco BIC, ligado ao Eurobic ( dono dos activos do ex-BPN).

Se um dos objectivos deste tipo de convenções, desenhadas seguindo o padrão da OCDE, passa por prevenir casos de duplas tributações de IRC e IRS, o seu alcance é mais vasto, ao pretender também prevenir e combater o efeito contrário, isto é, esquemas de fraude, branqueamento de capitais ou montagens artificiais que exploram as malhas da lei para evitar o pagamento de impostos ou reduzir a factura fiscal.

É expectável que este novo passo acelere a colaboração entre Luanda e Lisboa, não só depois da recente aproximação entre as duas administrações fiscais, mas também porque não é um instrumento que surja isolado. Há um segundo acordo, desenhado desde Setembro de 2018 e já com efeitos práticos, que permite às duas administrações colaborarem entre si em investigações fiscais administrativas, desde realizar “controlos fiscais simultâneos”, a participar em “controlos fiscais no estrangeiro”, passando pela assistência na cobrança de impostos e créditos tributários, “incluindo as providências cautelares”.

Investigar ao mesmo tempo

O primeiro acordo (a convenção de trocas de informações) significa, por exemplo, que se Luanda precisar de dados sobre uma empresa do cadastro do fisco português ou sobre o património financeiro de um contribuinte angolano que tenha residência em Portugal, a Administração-Geral Tributária ( AGT) vai poder solicitá-los ao fisco português, da mesma forma que a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) portuguesa poderá fazer pedidos idênticos ou, de forma espontânea, enviar informação que considere relevante para Angola.

É uma mudança de fundo em relação ao que se tem passado até agora, pois até agora não havia uma base legal para regular essa troca. Em teoria, podia existir esse acesso nos casos de colaboração judiciária (em processos-crime que implicassem, por exemplo, a investigação da fraude fiscal), mas não havia troca de informação administrativa de forma directa entre a AGT e a AT. Com uma excepção: a troca de informações de risco na área do tráfico de droga e contrafacção, regulada por um memorando antifraude assinado entre directores-gerais das autoridades aduaneiras dos países da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

Tanto assim é que Angola não aparece nos relatórios oficiais do Ministério das Finanças português na lista dos países a quem a AT enviou (e de quem recebeu) informações fiscais a pedido ou de forma espontânea.

O segundo acordo assinado entre Luanda e Lisboa (o da assistência administrativa e cooperação fiscal) vem aprofundar as potencialidades do primeiro, ao abrir a porta a uma colaboração estreita num momento em que Luanda definiu como prioridades a recuperação de activos do Estado e o repatriamento coercivo de capitais colocados no estrangeiro de forma ilícita.

Por exemplo, a AGT poderá enviar inspectores tributários de Angola a Portugal ( da mesma forma que inspectores portugueses poderão ir a Angola). Será uma mudança sem precedentes nas relações entre as duas instituições.

Questionado pelo PÚBLICO sobre se o Estado português tem cooperado com Angola no processo de recuperação de activos de Angola e no combate ao branqueamento de capitais, o Ministério dos Negócios Estrangeiros não concretizou, limitando-se a elencar as possibilidades teóricas de cooperação previstas no acordo de assistência mútua e a referir que tem existido cooperação na introdução do IVA em Angola e troca de experiências, como o estágio dado em Lisboa a 27 técnicos do fisco angolano durante algumas semanas de 2019.

“Após o referido estágio, iniciou-se uma nova fase de cooperação, ao abrigo da qual funcionários da AT se deslocam a Angola para apoiar a implementação do IVA. Para além destes apoios , têm ocorrido deslocações de funcionários da AT enquadrados em missões do FMI, também com o propósito de assistir na implementação do IVA”, realça o Ministério dos Negócios Estrangeiros.

Fonte: PÚBLICO.

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