Angola ameaça vistos de portugueses

Existem cerca de 200 mil portugueses a viver e a trabalhar no país africano.
A concessão de vistos a cidadãos portugueses que queiram ir trabalhar ou viver em Angola, bem como a renovação de autorizações de residência, pode estar em risco se, até ao próximo dia 22 (data do início do julgamento da operação Fizz), não se resolver a questão que envolve o ex-vice-presidente de Angola, apurou o CM. Manuel Vicente foi acusado pelo Ministério Público português dos crimes de corrupção, branqueamento de capitais e falsificação de documento. Vicente é acusado de ter pagado cerca de 800 mil euros ao procurador Orlando Figueira para arquivar uma série de processos que corriam no Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) contra si e contra diversos cidadãos angolanos.
Esta acusação foi considerada esta segunda-feira “uma ofensa” pelo presidente angolano, João Lourenço, durante uma entrevista dada a um conjunto de jornalistas, em Luanda. Lourenço adiantou que Angola pediu a transferência do processo que diz respeito a Manuel Vicente ao abrigo do acordo judiciário que existe no quadro da Comunidade dos Países de Língua Oficial Portuguesa (CPLP), mas que a resposta de Portugal “foi negativa”.
Questionado pelo correspondente da RTP sobre o que seria necessário para normalizar as relações entre Portugal e Angola, João Lourenço disse que “apenas um gesto”, concretizando que esse gesto passa por remeter o processo de Manuel Vicente para Angola. Acrescentando ainda que “não estamos a pedir o arquivamento ou a absolvição” do processo que envolve Manuel Vicente. Existem cerca de 200 mil portugueses a trabalhar e a viver em Angola, mas as trocas comerciais entre os dois países sofreram uma queda substancial durante os últimos dois anos. As exportações portuguesas para Angola caíram mais de 26 por cento e mais de duas mil empresas deixaram de ter negócios com aquele país africano, segundo o INE.
Administração do Fundo Soberano pode cair A administração do Fundo Soberano de Angola, liderada por José Filomeno dos Santos, filho do ex-presidente José Eduardo dos Santos, pode ser exonerada nos próximos dias, admitiu esta segunda-feira João Lourenço.
O presidente angolano disse estar a analisar as medidas propostas pelo Ministério das Finanças na sequência da auditoria feita por uma empresa externa às contas do Fundo, e prometeu resultados em breve. “Não digo que vou exonerar, mas pode vir a acontecer”, disse o chefe de Estado.
O Fundo Soberano de Angola, que tem uma dotação de cinco mil milhões de dólares (4,2 mil milhões de euros), foi criado em 2012 para gerir os ativos do Estado e é liderado desde então por João Filomeno dos Santos. Suspeitas sobre a gestão e as contas do organismo levantadas no âmbito dos ‘Papéis do Paraíso’ levaram o novo presidente angolano a pedir uma auditoria ao Fundo, cujos resultados foram recentemente entregues ao Ministério das Finanças. Recorde-se que José Filomeno dos Santos foi o único filho do ex-presidente a escapar – pelo menos, até agora – à onda de exonerações promovida por João Lourenço após tomar posse.
A irmã Isabel dos Santos, a mulher mais rica de África, foi afastada em novembro do Conselho de Administração da Sonangol, no mesmo dia em que o governo retirou à empresa Semba Comunicação, dos irmãos Tchizé e José Paulino dos Santos, a gestão do segundo canal da Televisão Pública de Angola (TPA), num duplo golpe que foi visto como um corte radical com o regime de Eduardo dos Santos.
Rendimentos permitiam compra de apartamento de luxo no Estoril
As suspeitas de corrupção que atingiram Manuel Vicente estão relacionadas com o facto de Orlando Figueira, então procurador, ter investigado o ex-vice de Angola, a propósito da compra de uma casa, por quase quatro milhões de euros, no Estoril.
O processo foi arquivado pelo magistrado e o DCIAP veio depois dizer que o arquivamento foi uma contrapartida pelo emprego que Vicente arranjou a Figueira. No processo, o ex-vice de Angola tinha explicado a compra da casa. Dizia quanto ganhava, números que não foram tornados públicos pelo juiz, por dizerem respeito à reserva da vida privada.
João Lourenço nega “crispação” com o antecessor
João Lourenço negou sentir “crispação” com o antecessor, com quem diz manter “uma relação normal de trabalho”. Sobre a promessa de Eduardo dos Santos de deixar a liderança do MPLA em 2018, o presidente angolano disse que “só a ele compete dizer se o fará”.
“Conveniência de serviço”
O presidente angolano justificou o afastamento de Isabel dos Santos da presidência da Sonangol com “conveniência de serviço”.
“Não me recordo de o presidente da República, alguma vez no passado, ter de justificar exonerações”, acrescentou.
Fonte: CM