
Luanda acaba de dar um novo sinal político de endurecimento nas relações com Lisboa. Depois de congelada a troca de visitas entre os mais altos dignitários de Portugal e Angola, virou as costas à participação de uma delegação governamental de alto nível na cimeira empresarial luso-angolana, que estava agendada para 27 deste mês em Lisboa. Nessa semana, vai receber o presidente do Governo espanhol.
“Enquanto não for resolvido este caso [ de Manuel Vicente] com o envio do processo para Angola, não estaremos virados para aí”, disse ao Expresso fonte da Presidência angolana, referindo-se ao processo que envolve o antigo vice-presidente de Angola, Manuel Vicente, num alegado caso de corrupção.
Este processo judicial pode, aliás, levar Angola a inflectir para outros mercados em detrimento de Portugal. Angola cancelou a participação na cimeira luso-angolana que estava em preparação, para dia 27 em Lisboa, por querer concentrar-se na recepção à comitiva espanhola que chega a Luanda na mesma altura.
Em Lisboa, foi um balde de água fria. A organização do evento pretendia contornar a agitação política com uma demonstração de proximidade empresarial. Os convites estavam prontos a ser expedidos e já estavam confirmados os patrocínios. O encontro foi adiado. O receio é de que não venha sequer a acontecer.
“Estamos empenhados em priorizar a cooperação com Espanha, que tendo tudo de que necessitamos, ainda tem a vantagem de nos conceder apoios financeiros que não estão ao alcance de Portugal”, disse uma fonte angolana envolvida na preparação da visita do primeiro-ministro espanhol, Mariano Rajoy, a Luanda. Esta posição dá força à promessa (ou ameaça) feitas antes pelo Governo de Luanda de que iria aproximar-se mais de Espanha em detrimento de Portugal.
Depois de ter garantido a presença de um governante na conferência luso-angolana, que seria encerrada por Marcelo Rebelo de Sousa, o Presidente João Lourenço já tinha, segundo apurou o Expresso, optado por circunscrever a representação angolana a uma presença simbólica do seu embaixador em Portugal, José Marcos Barrica, que nem sequer estaria mandatado para fazer qualquer intervenção.
Sem perda de tempo, Luanda “adubou o terreno” para Espanha e, na próxima semana, deverá estender o tapete vermelho ao presidente do Governo espanhol para receber uma linha de crédito de monta.
Em Lisboa, o adiamento da conferência foi justificado pelo facto de naquela data se realizar em Abidjan um fórum de negócios africanos, onde estarão empresários angolanos. Mas em Luanda assume-se a intenção de desvalorizar a iniciativa portuguesa que, para alguns analistas, terá intencionalmente sido agendada para coincidir com a realização no mesmo dia de uma conferência de negócios restrita que, reunindo a elite empresarial de Angola e Espanha, sendo encerrada por Mariano Rajoy.
O presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portugal-Angola, João Luís Traça, desvaloriza o adiamento, que relaciona com “um problema de compatibilização de agendas”, garantindo que a entidade “continua empenhada em ajudar a criar oportunidades e aprofundar o relacionamento entre empresas dos dois países”.
Entre os promotores portugueses da cimeira há a vontade de voltar a reagendar a cimeira para maio ou setembro. Em Belém, porém, considera-se o evento adiado sine die. Marcelo aceitaria encerrar a cimeira no pressuposto de que os dois governos se fariam representar ao mais alto nível.
Fonte: Expresso