CGD dá crédito de 125 milhões de euros sem avaliar situação financeira de Isabel dos Santos

A Caixa Geral de Depósitos (CGD) deu um crédito de 125 milhões de euros a Isabel dos Santos sem ter avaliado se a empresária angolana, apontada como uma das mais ricas de África, tinha capacidade financeira para pagar.
Questionada pelo Correio da Manhã sobre este crédito, fonte próxima de Isabel dos Santos garantiu que, além das obrigações contratuais estarem a ser cumpridas, “o crédito está em dia, e grande parte já foi amortizado”.
No relatório sobre os créditos concedidos pela Caixa Geral de Depósitos para a compra de acções, classificado como confidencial, o Banco de Portugal (BdP) critica o crédito concedido à Kento Holding Limited.
“Os fundamentos considerados para a concessão do crédito em apreço, assentes essencialmente nas garantias associadas por indisponibilidade de informação sobre a situação financeira do mutuário [Isabel dos Santos], não são compatíveis com uma prática prudente de concessão de crédito”, diz o documento do Banco de Portugal.
O crédito da CGD permitiu à empresária angolana, em conjunto com outros fundos, comprar acções representativas de 10% do capital social da Zon (actual NOS). Os vendedores destes títulos foram a própria CGD (2%), a Cinveste (3,43%) e a Zon (4,57% de acções próprias).
Quanto ao risco desta operação, o relatório do BdP é esclarecedor:
“A análise de risco constante do processo, elaborado pela DGR [Direcção-Geral de Risco], consistiu, sobretudo, na análise da situação da Zon, apontando o parecer no sentido de uma sindicância do empréstimo solicitado pela Kento, com a justificação de que a CGD já tinha um envolvimento significativo com a Zon e que não se encontrava disponível qualquer informação que permitisse avaliar a capacidade financeira da engenheira Isabel dos Santos”.
Mesmo não tendo informação que permitisse avaliar se a empresária angolana podia pagar a dívida, a CGD considerou a operação segura.
Por este motivo: “A DGE [Direcção -Geral de Empresas] tinha conhecimento das participações que a cliente [Isabel dos Santos] detinha em diversas empresas e as informações eram muito abonatórias em relação à sua capacidade financeira”.
Cabral dos Santos, responsável máximo da DGE , explicou ao BdP o interesse desta operação para o banco público: a CGD reduziria a sua exposição na Zon, uma vez que venderia acções dessa empresa; a Zon alienaria títulos próprios a um preço que garantiria à CGD, enquanto accionista, mais-valias ; e a Cinveste, detida pelo coronel Luís Silva, comprometia-se a usar a receita das vendas das acções da Zon na amortização de responsabilidades com a emissão de papel comercial.
O director da DGE indicou ainda que “a capacidade financeira dos accionistas da empresa [Kento] era confortável” e que “as garantias apresentadas eram consideradas suficientes”.
Para garantir o pagamento do empréstimo, Isabel dos Santos deu à CGD garantias que cobriam 115% do valor do crédito.
Mesmo assim, a DGR deu um parecer condicionado à operação. A 23 de Dezembro de 2009, véspera de Natal, o Conselho Alargado de Crédito (CAC), em que a administração aprova os créditos mais elevados, aprovou o crédito à Kento.
Para esta aprovação, contribuiu, segundo Cabral dos Santos, “a qualidade das garantias”, em particular a “existência de aval pessoal da engenheira Isabel dos Santos” e “um depósito [a prazo] obrigatório para reforço da garantia real [as acções]”.
Como considerou a operação imprudente, o BdP recomendou à CGD que, de futuro, passasse a avaliar a situação financeira dos devedores.
A operação é revelada num relatório do Banco de Portugal, realizado em 2011, sobre os créditos da CGD para a compra de acções. O documento revela as condições do crédito da CGD à Kento de Isabel dos Santos: prazo de sete anos, com três anos de carência de capital, e pagamento de juros semestral à taxa Euribor 6 meses, mais um spread de 2%.
Para pagamento deste crédito, “as garantias consistem no penhor financeiro das acções adquiridas, num depósito a prazo (no valor inicial de 14,425 milhões de euros), a remunerar em condições de mercado, e o aval da engenheira Isabel dos Santos, consubstanciado numa livrança subscrita pela Kento e avaliada pela própria [Isabel dos Santos]”, frisa o relatório.
Fonte: CM.