Eugénio Costa AlmeidaOpinião

Despeito e Desrespeito!

A vida é dos valores imateriais da raça humana que todos mais devem respeitar. Pode haver vários tipos de humanos, mas raça é só uma e essa deve ser respeitada em todos os seus vectores.

Esta introdução prende-se com dois factos ocorridos nestas últimas semanas, um dos quais, no final desta semana, e que colocaram, e colocam, em causa o respeito pelas pessoas, pela sua qualidade de vida, pelos seus valores pessoais, políticos, sociais e económicos. Ou seja, a vida humana parece ser, ou ter, pouco valor para certas pessoas!

Há umas semanas que andamos a (não) ver o que se passa na província de Cabinda – de recordar que ainda há duas ou três semanas abordei, neste portal, o problema no exclave –, em particular sobre a situação dos detidos que procuraram usar de uma prerrogativa constitucional que lhes dá o direito de se manifestarem, desde que cumpridas as devidas normas jurídicas que a CRA impõe. Ainda antes de se fazer a manifestação – e ó pelo facto de a desejarem fazer – alguns dos seus mentores foram detidos.

Outros que procuraram levar por dante a manifestação – sou de crer que ela estava devidamente informada às autoridades como impões, e só a CRA – foram, segundo algumas fontes – não estava presente, logo não posso aferir da veracidade, ainda que são várias e diferentes a afirmá-lo –, detidos de forma pouco correcta.

E ainda continuam detidos e, de acordo com vozes de Cabinda, sem que os seus direitos constitucionais, como angolanos, tais como, direito a visitas, assistência familiar e médica, entre outros sejam cumpridos; por exemplo, até hoje, e não sei se houve ou não esse direito usado, não ouvi ou li que os detidos tenham tido direito à presença de um advogado. Quero acreditar que sim e que p procurador provincial teve alguma influência nisso.

O certo é que, segundo a edição desta fim-de-semana, 576, de 15 de Março, do semanário Novo Jornal, na página 12, o Governador provincial, Eugénio Laborinho, ter-se-á negado «a receber os deputados do Grupo Parlamentar da UNITA que pretendiam abordar com a governação local o caso dos 63 activistas que estão detidos há um mês naquela parcela do país».

Apesar do problema ser um caso de Justiça, esta atitude do Governador provincial é grave porque desrespeitou quem foi eleito directamente pelo Povo, ao contrário da sua posição que é dimanada de um acto político do senhor Presidente da República. Não é só a este que um Governador provincial tem de prestar contas. Também tem de o fazer ao Governo e à Assembleia Nacional.

Poderia não querer discutir, invocando ser um caso jurídico e não político. Mas tinha a obrigação de receber os deputados. E pelo que se infere – sublinho, porque não estava presente, pelo que se infere – da notícia do Novo Jornal o senhor Governador provincial ter-se-á negado a receber os deputados.

Despeito e desrespeito que o senhor Presidente João Lourenço tem de alertar para os seus, ainda e até eleições regionais autárquicas, legítimos representantes.

O outro caso, mais recente, de desrespeito pela vida humana, e por ser tão recente e estar ainda na flor da pele das pessoas, abordarei de forma mais contida.

Foi o infausto acontecimento, no município do Rocha Pinto, com uma zungueira, que levou à sua morte e que, segundo pude ler na já citada edição do semanário Novo Jornal, também há um jovem, de 19 anos, que acabou atingido no fígado, por balas dispersas que sucederam ao disparo que vitimou a zungueira Juliana Kafrique, ou Juliana Jacinto Félix, que deixou para trás 3 crianças órfãs.

Tal como no caso anterior, acredito que tudo tenha começado por uma questão de Justiça e de, eventualmente, desrespeito pelas novas normas de zunga. Mas não vivemos num Estado policial – e acredito que todos pensamos assim –, tipo “far-west” norte-americano”, em que alguns policiais atiram primeiro e perguntam depois.

O problema é que a fazer fé nos diversos (inúmeros) relatos que perpassam pelas páginas sociais, alguns com detalhes que os tornam muito credíveis, não será a primeira vez que o uso indevido de uma arma se faz presente em casos de zunga.

Não defendo que se retirem as armas as polícias. Não temos uma educação cívica como os britânicos que não as usam na via pública e só em casos especiais é que elas saem para as ruas e só por polícias devidamente preparados para tal.

Mas se os nossos polícias não estão – ou ainda não estão – preparados para saber quando, como e de que forma as devem usar, propunha que em vez de pistolas as nossas polícias passassem a usar “tasers” – armas de choque – que, como se sabe, raramente matam, mas que dominam tumultos. E, tal como os britânicos ou outras foças policiais mais evoluídas tecnicamente, as “armas pesadas, tipo AK ou similares”, só devriam sair quando fosse, efectivamente, caso disso e só, por princípio, para dominar qualquer situação de extrema delicadeza.

Por certo que quando o senhor Presidente João Lourenço decidiu, e bem devido, principalmente, à segurança alimentar e, porque não, até física daas e dos zungueiras e vendedores ambulantes, levar por diante a “Operação Resgate” não pensou, nem previu que a vida humana fosse despeitada e desrespeitada.

Que a Justiça, os constitucionalistas e os legisladores se atravessam, de vez, nestes assuntos e criem leis claras que impeçam o despeito e desrespeito pela vida humana, ou seja, o desrespeito pelos mais elementares direitos de um ser humano.

Queremos um Estado onde a liberdade, a justiça e a democracia sejam justas e estejam sempre de mãos dadas, e não um Estado onde  as armas de fogo, que deveriam se ter calado, de vez, a 4 de Abril de 2002, ainda se façam ouvir e pelas razões menos aceitáveis!

Como também queremos um Estado onde a diversidade de opinião não esteja sempre colocada na cadeia, pelo menos desde que não hajam desrespeito e despeito pelas mínimas condições de vida humana.

*Investigador do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE-IUL(CEI-IUL) e investigação para Pós-Doutorado pela Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Agostinho Neto**

** Todos os textos por mim escritos só me responsabilizam a mim e não às entidades a que estou agregado



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