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Espólio de Amílcar Cabral vai ficar na Fundação Mário Soares e Maria Barroso

Em 2018, avançou-se a hipótese de restituição à Guiné-Bissau do espólio de Amílcar Cabral devido à difícil situação financeira. Mas a instituição em Lisboa garante que superou desafios e vai preservar o arquivo.

O acervo documental de Amílcar Cabral – líder da luta de libertação pela independência da Guiné-Bissau e Cabo Verde, assassinado a 20 de Janeiro de 1973 em Conacri – vai continuar guardado na Fundação Mário Soares e Maria Barroso, em Lisboa. A instituição corria o risco de fechar as portas depois da morte do seu patrono, o ex-Presidente português Mário Soares.

O secretário-geral da Fundação, Filipe Guimarães da Silva, disse que a instituição, agora mais folgada no plano financeiro, vai prosseguir a sua função arquivista, estimulando e impulsionando o seu estudo, investigação e divulgação em acesso aberto ao público, muito em particular através da Casa Comum. Enquadra-se neste contexto o arquivo “Amílcar Cabral”.

“Foi por solicitação das autoridades guineenses, mediante um protocolo de depósitos estabelecido entre as partes, em Agosto de 1999, que a Fundação desenvolveu desde então um conjunto de actividades de resgate, salvaguarda, tratamento, organização e digitalização dos documentos de Amílcar Cabral, que hoje constituem um arquivo Amílcar Cabral”, sublinha.

Os documentos estavam antes estragados, outros queimados pelas tropas senegalesas e desprezados nas ruas de Bissau. Foram as autoridades guineenses de então, na pessoa do ex-primeiro-ministro Francisco Fadul, que confiaram à Fundação Mário Soares e Maria Barroso a recuperação e arquivo temporário dos documentos em Lisboa. O espólio é constituído por manuscritos, fotografias, alguns CDs e livros importantes.

“Trata-se de um acervo documental importante na representação dos vários aspectos da luta pela independência na Guiné-Bissau e fundamental para a compreensão da história e da memória dos movimentos de libertação africanos e que reúne documentação de cariz político, militar, diplomático, salientando-se naturalmente os manuscritos produzidos por Amílcar Cabral”, diz.

Investigação académica

Hélder Vaz, embaixador da Guiné-Bissau em Portugal, acompanhou todo o processo mandatado pelo Presidente guineense, Umaro Sissoco Embaló. Ficou assegurado às autoridades guineenses que não havia qualquer risco do espólio de Amílcar Cabral deixar de estar na Fundação.

“Mas se viesse a surgir alguma circunstância nova que alterasse esta garantia que nos foi dada, quer Carlos Monjardino quer a Isabel Soares [administradores da FMS], teriam o cuidado de informar as autoridades da Guiné-Bissau através da Embaixada para que nós pudéssemos tomar as diligências no sentido do repatriamento do espólio para a Guiné-Bissau”, afirmou.

O diplomata reconhece que a documentação digitalizada e guardada pela Fundação em Lisboa é útil para trabalhos de investigação académica e não só. “Claro que esse espólio é objecto de muita pesquisa e tem servido de suporte a trabalhos de investigação que, naturalmente, são benéficos para o Estado da Guiné-Bissau e têm de ser perspectivados também sob esse ponto de vista da sua utilidade. E têm que ser criadas condições para que essa utilidade seja, no mínimo, acrescida”, disse.

País natal

Para Juvenal Cabral, sobrinho do “pai” da independência da Guiné-Bissau e Cabo Verde, fazia todo o sentido o espólio de Amílcar Cabral estar no seu país natal, pelo qual lutou.

“Infelizmente, a Guiné-Bissau, enquanto Estado, ainda não está devidamente organizada para ter o espólio. Não existe um museu, não existe nada. Vamos pegar no espólio que está aqui bem guardado, bem tratado, e vamos levá-lo para a Guiné-Bissau para pôr num canto, num armazém a apodrecer?”, questiona.

“Portanto, enquanto a Guiné-Bissau estiver como está, eu prefiro que o espólio esteja cá e, depois um dia que a Guiné-Bissau esteja bem organizada e que tenha condições de dar o devido destaque e tratamento que esse espólio necessita, aí sim, nessa altura, pode-se pensar em levar o espólio para a Guiné-Bissau”, acrescentou.

A possibilidade de restituição do acervo de Cabral ao país de origem não está posta de lado. Entretanto, a Fundação Mário Soares e Maria Barroso diz que vai continuar a manter contacto com os proprietários do arquivo, nomeadamente com as autoridades da Guiné-Bissau, com Iva Cabral, filha do carismático líder independentista, e com a Fundação Amílcar Cabral, na Cidade da Praia, mantendo o compromisso de garantir a preservação, a visibilidade e a reutilização deste património comum.

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