CronistasMárcio Roberto

Frúnculos islamofóbicos e a exclusão social que se inaugura em Angola

Os Mídias nacionais (incluindo a nossa Vivências Press News), fizeram-nos saber, há uma semana, do Julgamento de um grupo de seis angolanos acusados de organização terrorista e de jurarem “fidelidade” ao grupo terrorista Estado Islâmico. Os jovens estão em prisão preventiva desde dezembro de 2016, mas o caso apenas foi tornado público recentemente, depois de o Ministério Público (MP) acusar formalmente os seis arguidos. Sem surpresas, os acusados negam os crimes, considerando-se discriminados apenas por serem muçulmanos. Os seis indivíduos incorrem no crime previsto na Lei de Combate ao Branqueamento de Capitais e Financiamento de Terrorismo, que prevê uma moldura penal de cinco á quinze anos de prisão.

Conquanto, abordarei este assunto mais para frente. Agora, cumpriremos uma peregrinação no tempo que se julga necessária.

Estima-se que, o Islão tenha chegado em Angola na década de 80, trazído por imigrantes da África Ocidental. A religião instalou-se inicialmente na capital, Luanda. Hoje, no entanto, já se ouve falar na expansão da religião em algumas das províncias no sul do país. Angola ostenta quase 26 milhões de habitantes, destes, 96% são cristãos, todas as 86 igrejas e seitas religiosas reconhecidas pelo governo são igualmente cristãs. Há cerca de quatro anos atrás (2013), o nosso país caiu nas “bocas do mundo” por tornar-se no primeiro país, no mundo, a proibir o islão dentro das suas fronteiras, a posição de Angola foi ovacionada por fulanos e criticada por beltranos. Da parte do governo angolano, houve uma tentativa de disfarçar a “proibição”.

A verdade é que, todas as tentativas de legalização da Comunidade Islâmica de Angola, foram indeferidas pelo Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos, calcula-se que, mais de 94 denominações religiosas, seitas e associações religiosas no país, encontram-se na mesma situação. No caso da Comunidade Islâmica de Angola, uma das razões para o indeferimento é o reduzido número de fiéis. O Estado angolano exige, para o reconhecimento jurídico de uma denominação religiosa, a apresentação de registos notariados de um mínimo de 100,000 fiéis. Constata-se que, o número de muçulmanos no país não ultrapassa os 50,000 e mais de 90% daqueles, são estrangeiros oriundos das mais diversas partes dos continentes africano e asiático, muitos deles em situação ilegal. Por isso, deixemos de rodeios, em Angola a prática do Islão é ilegal, e se é ilegal é proibido. Desta forma, somos sim, o único país do mundo que não reconhece o Islão (ponto).

Retomando o ponto de partida. O caso dos seis muçulmanos que, repito, são angolanos, devido sua semelhança, remeteu-me ao famígero caso dos “15 + duas”, outro grupo de jovens, dezassete jovens que, sem qualquer motivação religiosa, reuniam-se para “pensar e falar política”. Os jovens foram detidos, julgados e condenados.

Passemos as semelhanças…

1- “Organização terrorista”, foi acusação que inicialmente incidia sobre os 15 + duas (terminaram acusados e condenados por actos preparatórios de rebelião e associação de malfeitores). O grupo muçulmano responde a mesma acusação, “Organização terrorista” (com o adicional juramento de fidelidade ao Estado Islâmico).

Transpira-me a ideia de que, na visão o MP, ambos os grupos pousam como associações formadas com o exclusivo propósito de cometer crimes, ainda que, nenhum tipo de arma tenha sido encontrado na posse dos mesmos.  

2- Um dos vários motivos apontados para a detenção dos primeiros (15+2), foi o conteúdo do livro que o grupo discutia, “From Dictatorship to Democracy” “Da Ditadura à Democracia” um livro de Gene Sharp (professor norte-americano de ciências políticas da Universidade de Massachusetts Dartmouth), sobre a luta sem recurso à violenta contra governos repressivos.

Com o grupo muçulmano foram apreendidos 106 livros, e após uma análise “peritista” concluiu-se que, pelo menos 38 dos 106 livros contêm material radical. Estes livros mais algumas conversas partilhadas pelo grupo, nas redes sociais, são algumas das provas ostentadas pela acusação (Ministério Público).

“Qualquer coincidência deverá ser um simples acaso.”

Depois do show produzido pela justiça angolana no caso 15 + duas, mostrando suas veias politizadas e a necessidade de agradar as “ordens superiores”, é normal que desconfiemos da seriedade/veracidade das acusações que recaem sobre o grupo muçulmano.

Podíamos falar mesmo na existência do que chamo “Islamofobia Política” que resulta na exclusão social de uma minoria com base em suas crenças religiosas, provocando alguma hostilidade social contra aqueles e, assim, devido a ausência do reconhecimento, da parte de quem governa, da prática religiosa das minorias, pensa-se justo o recurso á violência. Porém, no caso de Angola, como não se registam disputas e conflitos entre os cidadãos, tomam-se medidas politico-admirativas para desencorajar e travar o crescimento daqueles grupos ou minorias religiosas.

“Não é isso que queremos em nossa pátria.”

Interessa-nos ter uma sociedade justa, igualitária, equitativa e inclusiva e, para chegamos lá, teremos de incluir todos e aceitar as eventuais diferenças, sejam elas religiosas, culturais, físicas ou morais, só assim, alcançaremos a tão almejada “coesão social (a tal que gera desenvolvimento)”, construiremos uma sociedade para todos e com todos, uma “sociedade inclusiva”, na qual, cada indivíduo possuirá direitos, responsabilidades e um papel ativo a desempenhar…

Espero, pois, que neste caso dos seis indivíduos muçulmanos, a justiça faça o seu trabalho, despindo-se da politização que geralmente lhe circunda, pautando sua atuação nos princípios constitucionais da impessoalidade, moralidade e da legalidade.  

“É importante não nos deixarmos consumir pelo adágio que diz: os problemas devem ser resolvidos apenas depois de atingirem o ponto de maturação ou ebulição. Pois que, o ponto de ebulição poderá ser muito perigoso quando o Islão é o assunto em questão.”

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