
A Igreja Católica da República Democrática do Congo (RDC) considera já saber quem ganhou as eleições presidenciais, realizadas dois anos depois do previsto e após muita turbulência: o candidato da oposição, Martin Fayulu, um gestor petrolífero formado nos EUA e em França, e não Emmanuel Ramazani Shadary, o pouco conhecido ministro do Interior, que parece ter sido escolhido a dedo por joseph Kabila para o substituir nestas eleições a que não se apresenta, após 18 no poder .
O que é complicado nisto é que os resultados oficiais ainda não saíram e é provável que sejam divulgados hoje, como estava previsto, avisou a Comissão Eleitoral.
A Igreja Católica, provavelmente a instituição com maior credibilidade no país (cerca de 40% dos congoleses são católicos), não anunciou diretamente o vencedor. Mas disse ter feito um apuramento paralelo dos votos que indicou um vencedor claro, sem revelar o nome. Só que várias fontes diplomáticas ocidentais e fontes da própria Comissão Eleitoral, considerada próxima do Presidente cessante, confirmam que Fayulu é o vencedor na contagem da Igreja, diz o New York Times.
“Foi um sinal claro para o regime para que não tente manipular demasiado os resultados”, disse ao PÚBLICO o professor da Universidade de Antuérpia Kristof Titeca, por telefone. O investigador belga antevê um “impasse” entre o regime de Kabila e a Igreja Católica.
EUA com tropas no Gabão
O ambiente é de forte tensão e desconfiança, e o regime dá sinais numa direcção já conhecida pelos congoleses: o conflito.
Há vários dias que foi bloqueado o acesso à Internet, bem como o sinal da Radio France Internacional (RFI), sob o pretexto de ter divulgado ilegalmente resultados. A rádio, que também viu a acreditação da sua correspondência em Kinshasa revogada, nega as acusações.
Os resultados deveriam ser revelados hoje, mas a comissão eleitoral (CENI) avisou que pode haver atrasos . Na quinta-feira, o director da comissão, Corneille Nangaa, dizia ainda aguardar o envio de 80% dos boletins de votos das províncias.
Na sexta-feira, as Nações Unidas deixavam um derradeiro aviso para o barril de pólvora em formação.
“Sendo este um período muito sensível e muito tenso, estamos preocupados que estes esforços para calar a discórdia possam fazer ricochete quando os resultados forem anunciados”, afirmou o porta-voz do Alto-Comissariado para os Direitos Humanos, Ravina Shamdasani.
Os EUA enviaram tropas para o vizinho Gabão, que poderão intervir se houver violência.
Ao longo da sua turbulenta e sangrenta história, a República Democrática do Congo, um gigante africano com 80 milhões de habitantes, nunca teve uma transferência de poder pacífica. Muitos esperavam que a saída de cena de Joseph Kabila, ao fim de 18 anos, pudesse ser esse momento. Mas o receio é que o regime esteja a preparar-se para manipular os resultados a favor do seu candidato, Emmanuel Shadary.
É na RDC que estão metade das reservas mundiais de cobalto, um minério usado nas baterias para telemóveis, além de grandes depósitos de cobre, ouro e diamantes. O potencial para a exploração petrolífera também é elevado, mas é quase inutilizado. O investigador belga Kristof Titeca diz que a RDC poderia ser o segundo maior produtor em África, destronando Angola, mas nenhuma grande empresa está disposta a correr os riscos da instabilidade.
Fonte: Público.