Novo ciclo (ou não) em Angola

Iniciou-se um novo ciclo da vida do país com a mudança da presidência da república? Há variadas respostas a esta questão chave. Umas são convictamente afirmativas, outras são tenazmente pessimistas, bastantes são reticentes, algumas vislumbram possibilidades no caso de se concretizarem alguns pressupostos. É bom que haja tantas opiniões diferentes que livremente se expressam. Procuremos analisar a situação.
Não mudou o figurino político que existia antes da tomada de posse do novo presidente: a mesma Constituição que dá tantos poderes ao presidente da república e coarta o poder legislativo e judicial; o mesmo partido no poder; a mesma maioria qualificada desse partido no parlamento; os mesmos estatutos do partido no poder que fazem dele um partido estado (tal como foi concebido nos tempos da ditadura implantada com a Independência, em 1975); o mesmo domínio da vida económica, social, cultural e política por esse partido, ou seja, pelo MPLA.
Todavia, há verdadeiras mudanças na sociedade angolana que levam a questionar até que ponto o actual figurino político poderá ser entrave a mudanças políticas, económicas e sociais de que Angola urgentemente precisa. Essas mudanças na sociedade, resultantes do natural processo histórico, levaram a tomadas de consciência nos vários sectores da vida nacional que resultaram em debates em ciclos restritos ou públicos, dentro dos próprios partidos, ou em protestos na rua corporizados pelos demasiado voluntaristas “revus”, mas corajosos, e tão estupidamente reprimidos pelo anterior poder.
Portanto, não foram por acaso as mudanças havidas na sociedade civil, que se tornou mais interveniente (embora ainda muito pouco); as mudanças na acção da oposição e no seio do MPLA, que ditaram a mudança na presidência da república. Elas resultaram de necessidades históricas. Um outro sinal é a nova estratégia presidencial enunciada por João Lourenço no seu discurso de posse. Muitos duvidam da sua boa-fé ou da possibilidade de aplicação dessa estratégia, mas a verdade é que ela corresponde a uma necessidade nacional e o seu anúncio cria expectativas nos cidadãos e obrigações presidenciais e do seu partido para que seja aplicada.
Para concluir, tenho de responder à minha pergunta inicial. E digo que, de facto, estão criadas as condições para o arranque de um novo ciclo na vida do país. Para isso, é necessário que os vários sectores da sociedade civil saibam sair da dependência do poder político na afirmação dos seus interesses, compaginados com o interessa nacional. E é fundamental que todas as forças políticas e a sociedade civil colaborem na modificação do actual quadro institucional para que a sociedade angolana possa expressar todas as suas potenciais capacidades na construção dum estado democrático, próspero e de justiça social. A dinâmica assim criada levará às necessárias mudanças.