
O ministro dos Negócios Estrangeiros português vai receber hoje o seu homólogo da Guiné Equatorial, Simeón Oyono Esono, que está em Lisboa para uma missão enigmática : entregar uma carta secreta do seu Governo às autoridades portuguesas.
O encontro não representaria nada de especial entre dois Estados-membros da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), não fosse o secretismo de Malabo, que insiste em não dizer a Lisboa qual a razão da visita do ministro ou o tema da carta.
A estratégia já causou um dissabor a Teodoro Obiang, Presidente da Guiné Equatorial desde 1979: o pedido para que o seu novo chefe da diplomacia fosse recebido pelo Presidente Marcelo Rebelo de Sousa foi recusado. Em alternativa, Belém reencaminhou Oyono Esono para o ministro Augusto Santos e Silva.
A adensar o mistério, o novo ministro deverá ir ao Palácio das Necessidades acompanhado por Murade Murargy, antigo embaixador de Moçambique e secretário executivo da CPLP 2012 e 2016. Não é clara a razão que junta os dois diplomatas africanos, embora Murargy desempenhe há algum tempo funções de assessoria junto de Obiang, disseram ao PÚBLICO três conhecedores profundos da diplomacia lusófona.
Murargy conhecerá bem Obiang(uma filha sua é casada com um filho do Presidente da Guiné Equatorial), e sempre teve uma posição amigável em relação a Malabo, apelando à “paciência” da CPLP em relação ao novo membro do “clube”.
O chefe de Estado português não trata da política, pelo que, mesmo que soubesse o teor da carta, não seria a pessoa certa para receber Oyono Esono. Em circunstâncias particulares, há chefes da diplomacia que fazem visitas de cortesia a Belém. Em regra, isso acontece após reuniões nas Necessidades e vão acompanhados pelo ministro dos Negócios Estrangeiros português.
Nos bastidores, discute-se a possibilidade de a visita de Oyono Esono ter que ver com o desejo de Malabo assumir a presidência da CPLP já em 2020. Ontem, o diplomata da Guiné Equatorial fez uma visita à sede da CPLP, em Lisboa, e, no fim, assumiu essa vontade.
“Somos o benjamim da CPLP. Como país que acaba de entrar, gostaríamos de receber uma cimeira da CPLP”, disse aos jornalistas.
Não há regras estatutárias sobre esta rotatividade. A primeira presidência da CPLP, em 1996, foi de Portugal e a partir daí esta foi a sequência: Cabo Verde, Moçambique, Brasil, São Tomé e Príncipe, Guiné Bissau, Portugal, Angola, Moçambique, Timor-Leste e Brasil, que tem a presidência neste momento, sabendo-se que Cabo Verde a assume neste Verão, quando receber a XII cimeira dos chefes de Estado e de Governo. A expectativa é que a Guiné Bissau se lhe seguisse, mas o país vive uma arrastada crise política.
Diplomatas de diferentes Estados-membros disseram não compreenderem a “pressa” de Malabo, que só entrou na CPLP em 2014, lembrando que as presidências duram dois anos e organizam mais de cem reuniões, ao nível executivo mas também técnico e da sociedade civil, o que exige grande quantidade de pessoal de apoio capaz de falar e escrever português.
Na altura da adesão, o Presidente Obiang tinha um professor de português, mas ainda ontem o ministro Oyono Esono falou em espanhol ao responder às perguntas dos jornalistas em Lisboa. E foi em espanhol que explicou que “abolir a pena de morte implica um processo”, que desde a introdução da moratória “ninguém foi executado” e que “a pena de morte é um tema técnico que o sector judicial e a parte política estão a tratar para que seja abolida completamente”.
Fonte: PÚBLICO