Eugénio Costa AlmeidaOpinião

São Tomé e Príncipe não tem Marinha de Guerra, mas prepara a sua Marinha Mercante…

São Tome e Príncipe (STP) pode não ter uma Marinha de Guerra, mas parece que tem, ou prevê ter – por isso já tem oficiais formados – uma Marinha Mercante.

De acordo com um texto do site brasileiro “defesanet”, no início de Fevereiro, na embaixada brasileira, foram apresentados, quase 25 anos depois, os primeiros oficiais formados na Escola de Formação de Oficiais da Marinha Mercante (EFOMM), apoiados pelo Núcleo da Missão Naval da Marinha do Brasil, pela Embaixada do Brasil e em parceria com o Instituto Marítimo e Portuário (IMAP).

O último contingente santomense formado para a Marinha Mercante ocorreu em 1993, na antiga URSS (União Soviética) e na República de Cuba. Mas, – há sempre um mas… – para que os novos oficiais santomenses possam receber os diplomas e exercerem as suas funções, é necessária a realização do Estágio prático embarcado (PREST). E esse estágio deverá acontecer, segundo o defesanet, com parcerias “junto da Guarda Costeira” – a “Marinha de Guerra santomense –, com a Marinha Portuguesa e demais países amigos e parceiros de São Tomé para viabilizar a realização do PREST”. 

São Tomé e Príncipe, na realidade, não tem uma Marinha de Guerra, como convencionalmente se define, mas uma Guarda Costeira, que integram as Forças Armadas da República Democrática de São Tomé e Príncipe, sendo composta, conjecturavelmente, por cerca de meia centena de fuzileiros. A primeira companhia de fuzileiros da Guarda Costeira – 24 de 48 membros que formariam esta primeira companhia – foram formados e treinados no Brasil, durante quatro meses, por um grupo de oficiais da Marinha brasileira, em Dezembro de 2014.

Provavelmente, estes novos oficiais da Marinha Mercante santomense, deverá ser para comandarem os petroleiros e os navios metaneiros (transportes de petróleo e gás ou GPL) que transportarão os hidrocarbonetos que vão ser explorados e extraídos das suas águas profundas no Golfo…

Por acaso, como o Golfo da Guiné não é – só!! – a maior, ou segundo maior, zona de pirataria marítima, até se compreende que STP dê prevalência à formação de oficiais de Marinha Mercante em detrimento da Marinha de Guerra. Para isso tem uns quantos fuzileiros e uns quantos botes (não me perguntem quantos porque isso parece ser segredo de Estado; nem a revista especializada Military Balance o sabe, nem alguns santomenses que já contactei, por causa do meu pós-doutoramento e de vários trabalhos que tenho escrito no âmbito da Defesa e Segurança no Golfo da Guiné e o Atlântico Sul…) para defesa marítima.

Não há uma Marinha de Guerra em São Tomé e Príncipe, mesmo que algum país o tenha desejado oferecer algum vaso de guerra para defesa das suas águas territoriais e, ou plataforma continental porque uns quantos – vários – navios de guerra estrangeiros

estão a derrotar em águas santomenses e limítrofes.

Na realidade, os santomenses têm razão. Para quê gastar dinheiro com uma marinha de guerra se outros o fazem de borla.

Só que, muitas vezes, a borla tem ciclos que podem trazer amargos de boca. Recordo só que a proposta chinesa, no âmbito do “Belt and Road Initiative” (ou Nova Rota Chinesa) deveria ser bem ponderada quanto ao seu real e efectivo objectivo. Além dos objectivos meramente comerciais que este projecto chinês contempla, pode haver, objectivos militares claros.

E se pensarmos que o Atlântico Sul é uma rota importante entre o Índico (leia-se, Ásia e parte da Oceania) e o Ocidente, então mais sentido se torna merecer uma análise atenta à propostas chinesas de construção de um porto pesqueiro em STP para barcos santomenses e frota pesqueira chinesa – recordar o que a frota pesqueira da antiga União Soviética era, na realidade, – e a construção de um melhor aeroporto internacional em São Tomé.

Recorde-se que a antiga frota soviética era, além de frota pesqueira, barcos espiões sobre as actividades dos países ocidentais e da NATO. Não é em vão que, ainda no recente “tour africano” o Secretário-de-Estado norte-americano, Mike Pompeo, em Addis-Abeba, Etiópia, verberou a forte e demasiada influência económica e militar chinesa em África, “alertando de forma velada para as estratégias camufladas de Pequim” (site Novo Jornal de 20.Fev.2020).

A luta pela supremacia externa, das grandes e superpotências, em África, está a voltar. Na verdade, ela nunca deixou de acontecer. Seja entre norte-americanos e soviéticos; seja entre norte-americanos e chineses; seja entre estes e russos; seja entre todos eles e outros, como franceses. E os líderes africanos sentem-se, parece, seguros e nada preocupados com ela…

* Investigador do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE-IUL(CEI-IUL) e investigação para Pós-Doutorado pela Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Agostinho Neto; Investigador associado do CINAMIL**

** Todos os textos por mim escritos só me responsabilizam a mim e não às entidades a que estou agregado

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