Eugénio Costa AlmeidaOpinião

Reflexão 11: Ensaio em considerações dezembrinas…

O mês que ora finda e, com ele, o ano de 2019, parece ter sido o ideal para certos assuntos terem alguns desenvolvimentos e apreciações interessantes: seja a nível social, político e económico.

1. A família dos Santos, em particular as duas filhas mais velhas do antigo Presidente Engº José Eduardo dos Santos entraram em oposição aberta com o actual sistema governativo nacional. Oposição que também se sustenta no “auto-exílio” do Engº Eduardo dos Santos em Barcelona, Espanha, devido, segundo se pensa – porque nunca ninguém o confirmou ou desmentiu –, a razões de saúde. Não creio que seja por razões judiciais, porque como se sabe, os antigos Presidente e Vice-Prsidentes gozam de inimputabilidade durante um certo período de anos.

Depois dos eventos que ocorreram com a cassada deputada do MPLA, Welwitschia “Tchizé” dos Santos, a irmã mais velha, a Engª Isabel dos Santos concedeu uma entrevista ao portal noticioso português Observador onde fez as considerações que considerou pertinentes. O estranho, depois, parece – parece, porque não me é permitido aceder às páginas sociais da senhora Engª –, foi que ao transcrever para as suas páginas sociais, e segundo o VPN, citando o Observador, terá publicado «uma versão alterada, com destaque e fotos diferentes e sem algumas perguntas» da entrevista que poderão ler, segundo o Observador «alguns dos principais momentos aqui e ouvir a versão integral aqui».

Mas os assuntos da Engª Isabel dos Santos não se ficaram pela entrevista e da sua eventual truncagem. Quase em simultâneo, ou talvez em face disto, decorria um processo no Tribunal português de Sintra posto pela senhora Engª contra a antiga euro-deputada portuguesa, Drª Ana Gomes. De acordo com a queixa interposta pela primeira, a Drª Ana Gomes teria difamado a Engª de «lavar dinheiro através de Portugal» e da empresária contar «com cúmplices portugueses para corrupção» conforme pode ser lido aqui. O processo em causa, estranhamente – mas como não sou jurista, posso estar equivocado quanto à estranheza – não exigia uma retracção da Drª Ana Gomes, mas que esta retirasse as sua palavras por causa do «bom nome» da Engª.

Seria de presumir que a limpeza de um “bom nome” estaria num acórdão final do Tribunal em que a ré, Drª Ana Gomes, teria, não só de abjurar o que tinha dito ou escrito, como, com o acórdão, as acusações serem desmentidas. Mas não, só pedia que a Drª Ana Gomes anulasse o que tinha proferido contra a Engª…

De qualquer forma fonte próxima das duas irmãs, segundo o semanário português Sol, acusam o Governo de estar a prejudicá-las e de eventual perseguição política e haver uma «“vingança” e de “caça às bruxas cega” contra a família do ex-Presidente, de uma “tentativa de reescrever a história” e de “manchar o nome dos Santos”», como pode ser  

lido aqui.

2. Entretanto na Assembleia Nacional, o MPLA, sob proposta do BNA – única entidade que “imprime” e gere a moeda nacional –, fez aprovar a emissão de novas células (leia-se, novas notas) da nossa moeda nacional, o Kwanza, no que é perfeitamente natural. O que está a gerar alguma polémica é que as novas células passam a ter uma única figura evocativa. Igualmente, algo que se verifica em outras divisas internacionais, logo, natural; mas…

Mas o problema não está – na realidade, também está – na figura representativa das novas células (notas), mas na ausência de uma outra figura, até agora considerada como relevante para estar representada nas ditas cujas.

Ora as novas células não vão ter alguma figura pictógrafa nacional, como a Palanca Negra, as Quedas de Kalandula, ou a imagem da única representação nacional com a distinção de Património Mundial da UNESCO, Mbanza Kongo, ou a Welwitschia mirabilis, ou qualquer outro animal ou planta característica nacional, ou, histórica, como a Nzinga Mbandi, Ngola Kiluange, Mandume ya Ndemufayo, ou do Rei Ekuikui I, mas a efígie de alguém que é considerado como o principal poeta nacional e que, foi também, o primeiro Presidente de Angola.

Se é como Poeta, as restantes células poderiam ter como imagem outros poetas e escritores nacionais, alguns galardoados internacionalmente. Se é como político, ou como Presidente, então, José Eduardo dos Santos, deveria manter-se nas células.

De uma coisa temos a certeza, poderá haver murmúrios quanto à limpeza que terá sido, eventualmente, feita ao erário nacional durante o consolado do Engª Eduardo dos Santos; ou seja, da marimbondisse que muitos fizeram para proveito próprio e em nome ou sob eventual tutelização do referido consolado. Mas, o certo é que o antigo Presidente nunca foi objecto de uma denúncia pública de prática de actos contrários à boa gestão presidencial à Procuradoria-Geral da República, mesmo que ainda esteja sob protecção do artº 127, nº 3 da CRA, no caso de «crimes estranhos ao exercício das suas funções», durante 5 anos goza de imunidade ao abrigo «Lei sobre o Estatuto dos Antigos Presidentes da República de Angola, referindo no segundo artigo do primeiro capítulo que “a presente lei aplica-se não só aos antigos Presidentes como também aos antigos vice-Presidentes da República de Angola que tenham cessado funções”» (ler aqui), além de, ao abrigo da conjugação dos artº 135.º e 150º da CRA, o Engº Eduardo dos Santos goza, igualmente, de imunidade, por ser membro do Conselho de Revolução e de estatuto próximo dos Deputados.

3. O novo presidente da UNITA, Engº Adalberto da Costa Júnior deu uma extensa entrevista à TV Zimbo que o mensário Kandandu reproduz na íntegra. Desta entrevista ressalvo, de imediato, a «necessidade de haver maiores níveis de diálogo na sociedade angolana», críticas «pelo pacote autárquico estar dependente da aprovação da calendarização que aprove o referido pacote» e ao facto de não elegermos directamente o Presidente», alertas para uma maior intervenção/participação directa do «Presidente na gestão de empresas públicas, nomeadamente, nas da comunicação social através de uma maior aproximação aos referidos ministros tutelares», «a problemática da estadia do FMI em Angola», etc. A extensa entrevista merece uma maior e melhor leitura que

analisarei, mais tarde, se disso considerar oportuno.

4. Sobre a presença do FMI no País e o impacto que a mesma está a ter, directa ou indirectamente, na economia nacional, de registar o recente alerta desta instituição onde revê que a dívida pública de Angola vá para 111% este ano – valor elevado, ainda que seja considerada, de alguma forma, uma dívida sustentada, – e que só no fim do ajustamento é que caia para 70% (pode ler aqui), ainda que, de certa forma, na linha dos avisos a Fitch considere que o País está sob um forte endividamento e de deficiente reserva em divisas internacionais, pelo que, na sua opinião as nossas perspetives económicas para curto prazo sejam negativas, conforme o VPN o descreve, bem como na linha do que a consultora FocusEconomics, no seu relatório para Janeiro de 2020, alerta que, apesar de «a actividade económica deve recuperar em 2020 devido às reformas, à estabilidade política e ao apoio do Fundo Monetário Internacional (FMI), que vão sustentar os investimentos e a despesa privada», a «economia parece ter continuado em recessão no terceiro trimestre , com a produção petrolífera a cair de Julho a Setembro, o que, juntamente com a queda dos preços médios do petróleo, prejudicou o sector externo”, dizem os analistas, vincando que os dados disponíveis deixam pouco espaço para optimismo relativamente ao quarto trimestre» e que a «perspectiva de crescimento para o próximo ano foi cortada novamente este mês, de 1% para 0,7%, com o poderoso sector petrolífero a continuar a navegar em águas paradas e com pouca esperança de uma retoma» (pode ler a análise ao relatório aqui e aqui).

Navegação à vista e com poucas esperanças? Veremos como os empresários reagirão às propostas do Executivo para 2020.

5. De acordo com a ANGOP, o CFB «recebeu esta sexta-feira [27 de Dezembro] o primeiro lote de 60 vagões de carga, dos 300 encomendados à construtora chinesa Sinotrans, para reforçar o transporte de mercadorias diversas, incluindo o minério do Congo Democrático até ao Porto do Lobito, para exportação». Nada tenho contra que continuemos a importar as coisas da China. Mas ainda não criámos condições para construir carruagens em Angola, em particular no Lobito? Principalmente quando estas 60 carruagens custaram «três milhões e 600 mil dólares norte-americanos».

Recordemos que já construímos barcos e carruagens no Bairro do Liro, nas instalações da antiga Sorefame. Porque não procurar recuperar os “cadernos” desta antiga empresa – provavelmente, alguns estarão nos arquivos do CFB – e construirmos nós as carruagens. 

Em último caso, a sede que era em Portugal, deve ter esses “ficheiros” e poderão cedê-los a Angola.

Compreendo que os chassis, até porque não temos uma siderurgia, seja ainda difícil de sermos construtores. Mas uma coisa é importar carruagens, outra os chassis.

Também sei que temos de pagar as nossas dívidas aos chineses, mas não é importar carruagens da China que iremos diminuir essa dívida que aumenta a nossa dívida global que, como o FMI nos alerta pode ascender mais de 110% do nosso PIB, no próximo ano. Fica a sugestão.

E porque estamos no último dia do ano, desejo a todos um excelente e revigorante ano de 2020, esperando que os «progressos no campo da defesa dos direitos fundamentais do cidadão, da exigência de maior rigor na gestão dos recursos públicos, do combate ao nepotismo e à impunidade e da luta contra a corrupção» descritos na mensagem de Fim-de-Ano, na página oficial do Presidente João Lourenço (ver aqui a mensagem na íntegra), seja conseguida.

* Investigador do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE-IUL(CEI-IUL) e investigação para Pós-Doutorado pela Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Agostinho Neto; Investigador associado do CINAMIL**

** Todos os textos por mim escritos só me responsabilizam a mim e não às entidades a que estou agregado

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