Cronistas

Um discurso, várias certezas, uma dúvida

O discurso de um chefe de partido, no encerramento de um congresso, não teria habitualmente tanta repercussão interna e externa se não tivesse ocorrido em Angola, o partido não fosse o MPLA e o líder João Lourenço.

De facto, como o MPLA domina a vida política, económica, social e cultural de Angola – um país que se encontra em crise – tudo o que se passa nesse partido é de relevância e gera grande expectativa. Foi assim com a escolha do candidato para a presidência da república; foi assim, posteriormente, com a tensa transição da chefia do partido de José Eduardo dos Santos para João Lourenço; foi assim com o congresso extraordinário que consagrou essa passagem de poder.

No rescaldo desse congresso são relevantes as mudanças de nomes em vários órgãos partidários, nomeadamente na vice-presidência e Bureau Político e o discurso do novo chefe do MPLA, que é também o Chefe de Estado.

Através dele, o presidente João Lourenço mostrou que, além de ter poder de facto ao nível do seu partido e do país, exerce uma firme liderança. A sua intervenção no encerramento do congresso mostra como quer liderar o partido e o país. Contundente nas críticas às políticas e condutas partidárias e nas políticas e governação do Estado que têm caracterizado os últimos anos da vida pública angolana, João Lourenço anunciou que actuará sem complacências (e já tem mostrado isso) e procurará que o MPLA modifique alguns dos seus hábitos e saiba ligar-se melhor às populações, tudo isto num quadro mais vasto de democratização do País (exemplificado na referência ao processo de criação e implantação do poder autárquico).

Há quem argumente que tal discurso pode ser apenas um exercício retórico e não resultará em práticas adequadas. Penso que, neste seu primeiro ano de mandato como Chefe de Estado, João Lourenço já deu bastantes provas de querer protagonizar a mudança que Angola urgentemente necessita.

As questões enunciadas no seu discurso bem como o modo como as abordou mostram que o presidente compreendeu bem o momento histórico, conhece os problemas, está disposto a encontrar as soluções. Daí as várias directivas patentes na sua alocução: em relação à democratização da vida económica, política e administrativa; as referentes à efectiva participação da sociedade civil na discussão e resolução dos problemas; as relacionadas com a maior capacitação individual nos vários sectores e com um maior papel do empresariado nacional na economia; as que se referem a uma larga reconciliação nacional, a começar dentro do próprio MPLA que tantos militantes de vulto aboliu de figurar na sua história.

Sobre este último item referente à história do MPLA, quero fazer uma observação. A narrativa da sua formação foi construída de uma certa maneira por exigências do combate político que na luta de libertação a UPA travava contra o MPLA. Hoje já não há razão para se manter equívocos e é tempo de se fazer a verdadeira história. Daí a dúvida no meu espírito quando João Lourenço falou de Ilídio Machado como primeiro presidente do MPLA. Será que, neste partido, ainda não se abordou de modo adequado a questão da sua formação e da sua primeira liderança?

Portanto, esse discurso suscitou-me esta dúvida. Contudo – e isto é importantíssimo – o presidente João Lourenço deixou-me várias certezas: compreendeu o momento histórico angolano em toda a sua amplitude, decidiu empreender a necessária mudança, está a mostrar-se determinado a realizá-la. Isso é gratificante para mim, cidadão atento e antigo combatente pela independência, que só almeja o melhor para Angola e o seu povo.

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